CONVERSAS NA TAVERNA
Era meio-dia, da cozinha emanavam aqueles apetitosos e
estimulantes eflúvios, balsamo para uma boa refeição, enquanto se aguardava a
chegada dos clientes.
Quando o abanar das fitas da porta de entrada, fizeram
adivinhar a chegada dos dois primeiros clientes.
Ele, corpulento tinha o cabelo ruivo que lhe acentuava a cor
de cenourinha do rosto pintalgado, os olhos de um verde muito claro descansando
sobre um robusto nariz escarlate, alternavam para azul consoante a luminosidade
dos lábios finos e belicosos, seguravam um queixo minúsculo mas aparentemente
sólido.
Ela era jovem de porte altivo e imbuída de uma palidez quase
nórdica, cabelo loiro muito muto abundante e caprichosamente ondulado e pele
bem tisnada pelo sol. Envergava vestido azul-claro, comprido, alteando-lhe o
porte com um subtil e harmonioso toque.
- Bom-dia. Já servem refeições.
Perguntaram com ar majestoso.
- Bom-dia. Façam favor
Respondi, mostrando a entrada do restaurante, e dirigiram-se
para a sala.
Não sobrevieram longos minutos, para que um novo casal
começasse a dar entrada no estabelecimento.
Bom-dia.
Perguntei não obtendo qualquer resposta. Cabisbaixos e
deprimidos, tomaram a direcção da sala de jantar.
Ele, duns quarenta anos; baixote, disforme e malparecido,
tinha uma pronunciada curvatura nos ombros, cabeça calva, pescoço magro de
abutre e nariz proeminente e em foice, parecia arrastar o corpo.
Ela, talvez mais nova, segurava-o pelo braço e encaminhava-o
com suas pupilas herméticas e sibilinas, os seus traços eram voluntariosos e
mergulhados num oceano de gordura, cujas últimas vagas transformavam as rugas,
o quase inexistente pescoço.
É também desta freguesia flutuante de pobre diabos, que
estes negócios subsistem, e não sei bem porque ondas de miséria, de crime, ou
de azar, e que talvez felizes por se terem sentados à mesa e sem quase se
atreverem a levantar os olhos, com as costas curvadas sobre o passado que
parecia pesado, amontoavam longamente e demoradamente o pão na sopa, antes de
lá cravarem a colher.
Venturosos não se aperceberam do olhar faiscante e
reprovativo que os primeiros lhes dirigiam, sentindo-se humilhados pela sua
presença.
Conversa sem sentido
João Filipe
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