terça-feira, 28 de outubro de 2014

CONVERSAS NA TABERNA

CONVERSAS NA TAVERNA
Era meio-dia, da cozinha emanavam aqueles apetitosos e estimulantes eflúvios, balsamo para uma boa refeição, enquanto se aguardava a chegada dos clientes.
Quando o abanar das fitas da porta de entrada, fizeram adivinhar a chegada dos dois primeiros clientes.
Ele, corpulento tinha o cabelo ruivo que lhe acentuava a cor de cenourinha do rosto pintalgado, os olhos de um verde muito claro descansando sobre um robusto nariz escarlate, alternavam para azul consoante a luminosidade dos lábios finos e belicosos, seguravam um queixo minúsculo mas aparentemente sólido.
Ela era jovem de porte altivo e imbuída de uma palidez quase nórdica, cabelo loiro muito muto abundante e caprichosamente ondulado e pele bem tisnada pelo sol. Envergava vestido azul-claro, comprido, alteando-lhe o porte com um subtil e harmonioso toque.
- Bom-dia. Já servem refeições.
Perguntaram com ar majestoso.
- Bom-dia. Façam favor
Respondi, mostrando a entrada do restaurante, e dirigiram-se para a sala.
Não sobrevieram longos minutos, para que um novo casal começasse a dar entrada no estabelecimento.
Bom-dia.
Perguntei não obtendo qualquer resposta. Cabisbaixos e deprimidos, tomaram a direcção da sala de jantar.
Ele, duns quarenta anos; baixote, disforme e malparecido, tinha uma pronunciada curvatura nos ombros, cabeça calva, pescoço magro de abutre e nariz proeminente e em foice, parecia arrastar o corpo.
Ela, talvez mais nova, segurava-o pelo braço e encaminhava-o com suas pupilas herméticas e sibilinas, os seus traços eram voluntariosos e mergulhados num oceano de gordura, cujas últimas vagas transformavam as rugas, o quase inexistente pescoço.
É também desta freguesia flutuante de pobre diabos, que estes negócios subsistem, e não sei bem porque ondas de miséria, de crime, ou de azar, e que talvez felizes por se terem sentados à mesa e sem quase se atreverem a levantar os olhos, com as costas curvadas sobre o passado que parecia pesado, amontoavam longamente e demoradamente o pão na sopa, antes de lá cravarem a colher.
Venturosos não se aperceberam do olhar faiscante e reprovativo que os primeiros lhes dirigiam, sentindo-se humilhados pela sua presença.
Conversa sem sentido

João Filipe

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